sexta-feira, 9 de março de 2007

Realidade dos Biocombustíveis no Brasil e nos EUA

O apetite mundial por grãos para combustível de automóveis é insaciável, indicam pesquisas do Worldwatch Institute (WWI). Carros começam a disputar com pessoas pelo consumo de grãos. Um complexo quebra-cabeças da economia energética global está sendo montado.

Enquanto o relatório do respeitado Aspen Institute, intitulado "A high growth strategy for ethanol", propõe que a produção anual de etanol dos Estados Unidos chegue a 100 bilhões de galões, em 2025, sugerindo a transferência de programas atuais de apoio à agricultura
para um programa de apoio à agroenergia; o Instituto de Políticas da Terra alerta para uma nova onda de consumo onde muito do que comemos: trigo, milho, soja, amendoim, arroz, cana-de-açúcar, pode ser convertido em combustível para automóveis. Converter produtos da fazenda em combustível para automóvel passou a ser altamente lucrativo. Sempre que o valor de um produto agrícola cai, o mercado pode convertê-lo em combustível, mostra o WWI.

A cada dia a construção de uma nova destilaria é anunciada em algum lugar no mundo. No estado americano de Iowa, produtor de milho, onde 55 destilarias de etanol de milho estão previstas, o economista Bob Wisner, da Iowa State University, afirmou que se todas essas destilarias forem construídas usarão toda a safra de milho do Estado. Na Dakota do Sul, um dos dez maiores produtores de milho dos EUA, as destilarias propostas consumirão mais de cinqüenta por cento da safra de milho. Produtores americanos de bovinos, frangos e suínos estão preocupados com a pressão e a concorrência sobre os estoques de milho.

A quantidade de milho usada em destilarias de etanol americanas triplicou em cinco anos, de 18 milhões de toneladas em 2001, para 55 milhões em 2006, cerca de um sexto da colheita de grãos do país resultarão apenas em 3% de combustível para automóveis. Os grãos de milho transformados em etanol suficiente para encher o tanque de uma "van", alimentariam uma pessoa por um ano, mostram as pesquisas.

No ano passado, a União Européia produziu 1,6 bilhão de galões de biocombustíveis. 858 milhões de galões de biodiesel (89% da produção mundial) e 718 milhões de galões de etanol. Fabricantes de margarina já estão pedindo ajuda ao Parlamento Europeu para competir, no uso de grãos, com as refinarias do biodiesel subsidiado.

Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), do crescimento mundial da safra de grãos de 20 milhões de toneladas, esperado para 2006, 14 milhões de toneladas serão usados para produzir combustível para carros nos Estados Unidos, deixando o "resto", 6 milhões de toneladas, para satisfazer a agroindústria responsável por 74% da produção mundial de carne de aves, 50% da carne suína, 43% da carne de boi e 68% da produção de ovos, num mundo cuja população cresce em 76 milhões de habitantes por ano.

Movimentando as peças do quebra-cabeças, corporações aproveitam os fluxos de mercado. A primeira empresa americana que processa, distribui e comercializa seu biocombustível, usa tecnologia brasileira desenvolvida no Laboratório de Tecnologia Limpa (Ladatel), da Universidade de São Paulo (USP), de Ribeirão Preto. As sete unidades produtivas da EBI, que estarão em funcionamento em dois anos, consumirão investimentos de US$ 50 milhões por unidade, resultando num negócio global de US$ 500 milhões.

A atriz Julia Roberts acaba de assumir a presidência do conselho consultivo da EBI, passando a ser a porta-voz da empresa. "É importante que possamos expandir o uso de energias limpas", diz Roberts, conclamando os mais de 500 mil ônibus escolares dos EUA, transporte da geração que estará no poder nas próximas décadas adotando o biodielsel.

O artigo do repórter Jim Norman, publicado no "The New York Times", sobre a sua viagem de 245 km com 11 litros de óleo de soja comum, comprado em supermercado e usado no sistema secundário de combustível instalado no seu volkswagen, mostra a nova realidade em que vivemos.

A Embrapa e a UnB (Universidade de Brasília), centros de excelência da pesquisa nacional, desenvolveram uma mini usina com capacidade de produção de 500 litros diários de biodiesel. Acanhadas pela inexperiência em negócios, essas parceiras públicas, detentoras de vastos capitais sobre forma de conhecimento e lentas quando as conversas migram para o ambiente de negócios, podem "importar" a experiência negocial da USP. Agricultura familiar também é movida a
negócios.

Os 47 países mais pobres do mundo, movidos a petróleo importado, são produtores de grãos que podem continuar a ser usados para a alimentação ou utilizados para a agroenergia. Políticas públicas nacionais, dissociadas de cenários de governança global, são impotentes para lidar com a questão na dimensão requerida.

O Brasil, que ainda não despertou para a competição por grãos, produziu 16,5 bilhões de litros de etanol (45,2% do total mundial) e 500 mil empregos diretos, em 2005. Os EUA produziram 16,2 bilhões de litros de etanol (44,5 % do total mundial) e 200 mil empregos diretos. Segundo o Banco Mundial, a indústria dos biocombustíveis gera 100 vezes mais postos de trabalho por unidade de energia gerada que a indústria do petróleo.

Dentro dos setores emergentes da economia brasileira, o "setor verde" é um dos que mais cresce, liderado pela bioenergia. Outros ativos da biodiversidade esquentam a fila. Terras que hoje valem pouco, na percepção do velho paradigma rural, ainda dominante, passarão a valer muito no futuro.

Bancos e fundos de investimentos começam a movimentar área financeira ligada à natureza. Novas mentalidades sustentáveis na alta direção vêem influenciando bancos em todo o mundo, agregando valores à sociedade. Braços brasileiros de bancos estrangeiros estão surpreendendo suas matrizes, exportando competência e criatividade verde-amarela.

Peças do quebra-cabeças da economia energética mundial estão sendo postas na mesa, pessoas e carros competindo por grãos, geração de empregos e mudanças climáticas, são parte dos complexos problemas vividos pela humanidade no início deste novo século. O jogo revela tendências socioambientais, rotas tecnológicas, políticas públicas e movimento de capitais. O Brasil, citado como "big player" pelos parceiros energéticos internacionais, goza de posição privilegiada na copa mundial dos econegócios. Esta é a hora de vestir a bandeira e saber jogar.

Fonte: Portal Nacional

Nenhum comentário: