quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Porque não usar o Pinhão Manso para produzir biodiesel


Com o advento do Programa Brasileiro de Biodiesel e o surgimento de grande demanda por óleos vegetais, o pinhão manso (Jatropha curcas) tem sido divulgado como uma alternativa para fornecimento de matéria-prima.

Esta escolha se baseia na expectativa de que a planta possua alta produtividade de óleo, tenha baixo custo de produção (por ser perene) e seja resistente ao estresse hídrico, o que seria uma vantagem significativa principalmente na região semi-árida do país. No entanto, causa grande apreensão aos técnicos que vêm trabalhando com pinhão manso no Brasil, o incentivo ao plantio do pinhão manso em extensas áreas, pois é uma cultura sobre a qual o conhecimento técnico é extremamente limitado.

Grande parte das informações divulgadas sobre a cultura provém de fontes pouco confiáveis, principalmente da Internet, em páginas de empresas privadas, onde as vantagens da planta são exaltadas, mas suas limitações omitidas. A seguir, citam-se alguns tópicos que merecem atenção sobre a cultura:

- em diversos países da América do Sul e Central, África e Ásia há programas oficiais ou iniciativas particulares incentivando o plantio de pinhão manso, mas em nenhum deles esta cultura é tradicional, nem existem lavouras bem estabelecidas (com pelo menos 5 anos) onde se possa confirmar sua produtividade e rentabilidade (Severino et al., 2006); os plantios existentes no Brasil ainda não têm dimensão ou maturação suficiente para avaliar adequadamente a produtividade e custos de produção; as estimativas iniciais têm indicado que a renda bruta por hectare é muito baixa;

- não foram encontrados relatos científicos confiáveis que informem sua produtividade; há somente estimativas feitas com metodologia inadequada, como extrapolar a produção de uma planta isolada para produtividade em uma lavoura comercial (Heller, 1996); a maior parte dos trabalhos científicos sobre pinhão manso são estudos de laboratório ou casa de vegetação sobre temas específicos, como fisiologia, toxicidade de suas partes, produção de mudas, tecnologia de sementes, transesterificação do óleo etc;

- o pinhão manso ainda não foi domesticado e não existe nenhum programa de melhoramento genético bem estabelecido no mundo que tenha resultado em, ao menos uma cultivar que pudesse ser cultivada com maior segurança;

- a cultura não possui um sistema de produção minimamente validado, para que se possa recomendar a forma de propagação (sementes, estacas, mudas), a população de plantio, adubação, como e quando podar, como e quando fazer a colheita etc;

- em observações preliminares feitas em lavouras do Brasil e de outros países, nota-se que a planta é muito atacada por doenças (virose, oídio nas folhas, caules e flores, fusariose, podridão do sistema radicular e outras) e pragas (cigarrinha, ácaro branco, trips, broca do tronco, percevejo, cupim e outras);

- a maturação dos frutos é muito desuniforme e a colheita manual, o que eleva o custo de produção;

- no Brasil, não há mercado estabelecido para o pinhão manso, podendo haver poucos compradores e preços baixos ao produtor, o que se agrava por se tratar de uma cultura perene. Mesmo considerando a grande demanda para o biodiesel, o produtor dificilmente terá opções de venda além da indústria de extração mais próxima;

- as instituições bancárias ainda não estão preparadas para financiar o plantio de pinhão manso, pois não há garantia técnica para os produtores. Diante deste cenário, conclui-se que no Brasil ainda não é possível plantar pinhão manso de forma racional, recomendando-se aos produtores rurais que não sejam plantadas grandes áreas com Jatropha curcas devido ao alto risco de insucesso.

Reafirma-se a crença no alto potencial produtivo e consideráveis vantagens que o pinhão manso possui e a expectativa de que essa oleaginosa, no futuro, tenha importante participação no fornecimento de óleo para biodiesel. Neste sentido, diversas Unidades Descentralizadas da Embrapa, instituições de pesquisa e universidades do país, contando também com a parceria de outros países e dos agricultores que já estão plantando algumas áreas, já estão trabalhando no desenvolvimento de tecnologia para o pinhão manso, incluindo a criação de bancos de germoplasma, experimentos a campo em diferentes regiões e condições climáticas do país, estudos em casa-de-vegetação e em laboratório.

No entanto, por se tratar de uma planta perene, que só estabelece a produção após o quarto ano, estima-se que serão necessários vários anos para que se disponha de informações mais seguras sobre a cultura.

Enfatiza-se ainda a necessidade de reforçar os investimentos em pesquisa para esta cultura, e sua manutenção por longo prazo, para que as atividades possam chegar a resultados definitivos, pois a interrupção desse apoio financeiro durante a execução do trabalho pode inviabilizar todo o processo.

Artigo elaborado pelos pesquisadores:

Napoleão Esberard de Macêdo Beltrão, Liv Soares Severino e Fábio Akyioshi Suinaga – da Embrapa Algodão
João Flávio Veloso, da Embrapa Milho e Sorgo
Nilton Junqueira e Marcelo Fidelis, da Embrapa Cerrados
Nívio Poubel Gonçalves e Heloisa Matana Saturnino, da EPAMIG
Renato Roscoe, da Embrapa Agropecuária Oeste
Décio Gazzoni, da Embrapa Soja
Jason de Oliveira Duarte, da Embrapa Milho e Sorgo
Marcos Antônio Drumond e José Barbosa dos Anjos, da Embrapa Semi-árido.

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