A inovação tecnológica terá um papel central para manter o Brasil em primeiro plano na produção de bioenergias. Mas o país precisa unir forças – e cérebros – para ser capaz de promover rupturas de paradigmas que permitam acompanhar o ritmo inovativo norte-americano, preservando a competitividade brasileira.
A análise foi feita por João Furtado, coordenador de inovação tecnológica da FAPESP, nesta quarta-feira (10/10), na Conferência Internacional dos Biocombustíveis (Enerbio), em Brasília.
“Nós nos preparamos para uma trajetória incrementalista, na qual fomos bastante competentes, acumulando um desempenho que em 30 anos se mostrou bem-sucedido. Os Estados Unidos apostaram em outra estratégia, de sucessivas rupturas de paradigma. Começamos em um patamar muito superior ao dos norte-americanos, mas o crescimento da inovação deles é muito maior”, disse Furtado à Agência FAPESP.
Segundo ele, há muita pesquisa de qualidade sendo feita no Brasil na área de bioenergia e não faltam investimentos, mas os esforços ainda são dispersos e precisam ser feitos de forma concatenada. “Os resultados de pesquisa levam tempo, mas a mudança de uma trajetória incrementalista para uma trajetória de mudança de ruptura é rápida. Para isso, é preciso reunir as pessoas com o conhecimento, fazer as perguntas relevantes e gerar um processo de mobilização de talentos”, afirmou.
Para o também professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, a ciência brasileira é plenamente capaz de responder aos desafios. “A ciência que fez a decodificação do genoma está pronta para cuidar desse assunto. Mas não há um sentido de missão. A química, a genética, a biologia, a agronomia brasileiras estão dispersas, cuidando de mil problemas. É preciso reunir cem mentes brilhantes para se debruçar sobre esse assunto. Elas não precisam necessariamente de remuneração a peso de ouro – a ciência brasileira não é mercenária. Precisam de um sentido de missão e um planejamento estruturado”, disse.
Furtado apontou que será preciso dar aos pesquisadores a consciência de que há um objetivo importante, ambicioso e consistente o suficiente para trazê-los para a pesquisa em bioenergia. “É preciso que o pesquisador olhe para o tema sabendo que o futuro está ali. Se estiver claro que o tema será crucial nos próximos dez anos, o pesquisador irá encaminhar seus estudantes mais brilhantes para ele.”
Para iniciar o processo, ele aponta que é preciso haver um engajamento generalizado. “Não se trata de vontade política. Isso já existe. O que precisamos é somar as vontades políticas divergentes e focá-las em um objetivo comum. Com isso, o Brasil será capaz de tirar proveito da necessidade mundial de bioenergia. E nem é preciso que sejamos os líderes desse processo – precisamos saber acompanhá-lo com uma distância razoável e sermos capazes de adaptá-lo à circunstância brasileira”, disse.
O exemplo dado pelo professor da Poli para um modelo competitivo de inovação em bioenergia vem do principal concorrente brasileiro no setor: os Estados Unidos. Segundo ele, a estratégia nacional para o setor energético norte-americano é sintetizada pelos objetivos traçados no projeto da Agência de Projetos de Pesquisa Avançados.
“São quatro objetivos: atrair o maior numero possível de mentes brilhantes; focar nos investimentos em que o setor industrial não está disposto a assumir riscos elevados; institucionalizar as atividades de modo que os projetos que demonstrem eficiência se consolidem e sejam descartados os que pareciam promissores, mas não se estabeleceram; e, por último, criar uma nova ferramenta para aumentar intercâmbio entre pesquisa pública e setor privado”, afirmou.
No Brasil, no entanto, a realidade estaria bastante distante disso. “As trajetórias atuais são exclusivamente incrementais, baseando o aumento da produtividade em fatores como disponibilidade de terra, mecanização induzida pela lógica empresarial e a oferta de energia elétrica”, afirmou.
Segundo Furtado, no caso do etanol, a cadeia produtiva é bastante diversificada, isto é, tem competitividade desde a base até o vértice. Cada parte da cadeia reforça a competitividade do produto final. Isso permitiu que o país aprendesse, no processo industrial, a obter mais rendimento da produção de cana, dando ao setor um crescimento de 1,5% nos últimos anos.
“O problema é que muito desse crescimento é explicado pelo aumento da área cultivada. Consultei uma série de especialistas que apontam ser possível manter esse crescimento na produção agrícola. Mas eles dizem que um incremento de 2% já é muito improvável. Ou seja, estamos no limite de crescimento. Daqui para a frente, o que vai fazer diferença é a inovação”, disse.
Fonte: Agência Fapesp
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