quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Exportação de biodiesel

A Europa precisará de 20 bilhões de litros de biodiesel na próxima década e de 40 bilhões após 2020. Finalmente, a UE concluiu que é impossível produzir todo este biodiesel na Europa e que vai precisar de ajuda do Brasil. Para verificar se o Brasil pode cumprir as suas exigências de sustentabilidade, a União Européia contratou a Universidade de Wageningen, localizada na Holanda. O grupo de pesquisadores envolvido no estudo visitou o Brasil, por longos períodos. Esteve no Norte e no Sul. No Nordeste e no Centro Oeste. Conheceu mamona, dendê, soja e girassol. Conheceu as usinas de produção de biodiesel. Discutiu com pesquisadores, professores, produtores, industriais e ambientalistas. Juntou esta experiência com números e com as demandas da União Européia. Não apenas das lideranças, mas da sociedade civil, organizada ou não, dos formadores de opinião. E preparou o primeiro “approach” do estudo.

Discussão

No contexto do estudo, foi realizado no dia 19/11 passado, na cidade de The Hague (Holanda) o seminário “Quality and sustainability of biodiesel for export from Brazil.” De comum acordo com entidades brasileiras, a Universidade de Wageningen nos convidou para fazer uma apresentação sobre o tema, a fim de embasar a sua discussão. Tanto a apresentação dos pesquisadores europeus, quanto a minha palestra, demoraram uma hora cada, mas a discussão estendeu-se além de duas horas!. Ao final, outras duas horas foram necessárias para acordarmos pontos básicos, que necessitam de aprofundamento ou estudo, para chegar-se a uma conclusão final, ou seja, o que precisamos melhorar em nosso país para sermos os fornecedores de biodiesel da União Européia.

Sustentabilidade

A Europa vai precisar, daqui a quatro anos, de uns 4 bilhões de litros de biodiesel. Em 2020 o número é assombroso, algo acima dos 25 bilhões. Convencer os europeus que o Brasil pode produzir esta quantidade de óleo, dadas as garantias contratuais de demanda, não foi muito difícil. Para tanto bastou demonstrar que temos solo, água, clima, sementes e outros insumos, agricultores capazes e empresários de primeira linha. Discutir as especificações técnicas do biodiesel, e como vamos cumpri-las, também não foi difícil. Para isto existe a inteligentzia brasileira nas universidades e outras instituições de pesquisa.

A parte empedernida ocorreu na discussão das questões ambientais e sociais. As ONGs baseadas no Brasil – financiadas pelo Primeiro Mundo – se encarregam de veicular uma imagem muito distorcida do que ocorre no Brasil. Fui questionado sobre desmatamento na Amazônia; soja ou pastagem no lugar da mata; soja e milho que provocam erosão e poluem os rios; trabalho escravo na Amazônia ou nos canaviais; o balanço de carbono e a emissão de gases de efeito estufa dos cultivos energéticos e dezenas de outros tópicos. Afinal, eram duas dezenas de europeus do outro lado, sumamente interessados em que não pairasse qualquer dúvida sobre a capacidade de o Brasil produzir biodiesel de forma sustentável.

Pelo balanço final do evento, acho que respondi, convenientemente, a todas as questões - ao menos é o que ficou registrado. Não deixar dúvidas sobre a sustentabilidade ambiental e social da nossa agricultura passou a ser o busílis da questão e é importante que não percamos esta perspectiva para o médio e longo prazo. Ou seja, produzir será relativamente fácil. Colocar em um mercado que a cada dia impõe novas e crescentes exigências além das especificações técnicas, é que são elas.

A agenda da União Européia

Relato abaixo, de forma sucinta, a agenda que foi colocada na reunião e que precisa ser cumprida por quem pensar em exportar biocombustíveis para a União Européia.

  • O balanço de gases de efeito estufa de toda a cadeia produtiva deve ser positivo;
  • A produção de materia prima não deve ocorrer com prejuízo para a vegetação que seja considerada como importantes depósitos naturais de carbono da Natureza (ex. florestas);
  • A produção de biomassa para energia não deve colocar em risco a cadeia de suprimento de alimentos, nem as demais aplicações tradicionais da biomassa (ex. lenha, fitofármacos, materiais de construção, etc.)
  • A produção de biomassa não deve ocorrer à custa de aumento de risco para a biodiversidade, especialmente as espécies mais vulneráveis;
  • Na produção e processamento de biomassa, o solo e as suas principais características devem ser preservados ou melhorados;
  • Na produção e processamento de biomassa, a água de superfície, sub-superficial ou profunda não deve ser colocada em risco e a qualidade da água deve ser mantida ou melhorada;
  • Na produção e processamento de biomassa, a qualidade do ar deve ser mantida ou melhorada;
  • A produção de biomassa deve contribuir para a prosperidade do local de produção; e,
  • A produção de biomassa deve contribuir deve contribuir para o bem estar social, dos empregados e da população local.



    Está de bom tamanho ou ficou faltando algo?

    Com o perdão da brincadeira, vai ficar mais fácil produzir e comercializar míssil interbalístico que alimentos ou biocombustíveis, tamanhas as exigências que as mudanças climáticas globais e a as atitudes ambientalmente e socialmente corretas imporão à produção agrícola. No entanto, assim como os alimentos vinham sendo submetidos a agendas sanitárias, ambientais e, mais recentemente, sociais cada vez mais rígidas, parece-me lógico que a agenda seria aplicada aos biocombustíveis.

    Bem, meu registro final foi que o Brasil tem condições de cumprir esta agenda, integralmente. Desde que, o preço do produto contemple um bônus adicional pelas exigências não agronômicas ou não técnicas, que possuem um custo que representará um percentual elevado do custo de produção. E acho que esta deve ser a tecla da nossa negociação: sim, podemos entregar o produto exatamente do jeito que vocês estão encomendando.

    Troco
    Mas eu sou do tipo que dá um boi para não brigar e uma boiada para não fugir da briga. Os companheiros europeus foram lembrados que:

  • primeiro eles destruíram as suas florestas; e agora nos forçam a destruir a nossa, pois pagam preços altíssimos pela madeira nobre contrabandeada da Amazônia. Afinal, o desmatamento na Amazônia só ocorre porque cidadãos dos países ricos pagam preços exorbitantes pela madeira nobre extraída da mata;
  • que podemos investigar se há trabalho escravo aqui, mas se este for o critério, terão que fechar as importações da China, pois aquele país somente compete no mercado internacional à custa de trabalho escravo e exaustão dos recursos naturais, para não falar no cambio super-desvalorizado;

  • e que a principal razão do aparente descaso ambiental dos produtores agrícolas dos países emergentes é o alto subsidio agrícola do Primeiro Mundo, que derruba os preços dos produtos agrícolas deixando o agricultor sem capital para produzir, quanto mais para preservar.



    Não alivia a nossa responsabilidade, mas ao menos empata o jogo!

    Fonte: Jornal de Londrina - Décio Luiz Gazzoni - 22-11-2007

  • Nenhum comentário: