Na abafada fronteira da floresta amazônica mal se vê uma árvore. Até onde a vista alcança, vê-se campos verdes de soja recém-plantada.
O Brasil está a caminho de se tornar o maior exportador de soja do mundo. Apesar de ser vendida modestamente como alimento barato para humanos e animais, cada vez mais a soja é usada na fabricação de biodiesel, um combustível de queima mais limpa.
Os biocombustíveis brasileiros etanol e biodiesel estão sendo elogiados como os melhores exemplos globais de como combustíveis renováveis podem reduzir a dependência dos combustíveis fósseis.
O governador da Flórida, Charlie Crist, liderou uma missão comercial ao Brasil no mês passado, em grande parte concentrada em biocombustíveis.
Em janeiro, uma lei federal brasileira entrará em vigor exigindo que cada litro de diesel no Brasil seja misturado com 2% biodiesel, e a percentagem continuará subindo.
"Somente a soja hoje tem capacidade de produção para cumprir a demanda. Isso significa muita expansão", reconhece Carlos Klink, cientista brasileiro da Nature Conservancy que estudou em Harvard.
O rápido crescimento agrícola do Brasil, entretanto, alarmou os ambientalistas pelos efeitos na Amazônia, maior floresta úmida do mundo, uma região de vegetação tão densa que às vezes é chamada de "pulmão do planeta".
Será que a revolução dos combustíveis brasileiros pode de fato fazer mais mal do que bem?
"Gigantes agrícolas como a ADM (Archer Daniels Midland), Bunge e Cargill estabeleceram-se na Amazônia porque sabem que podem fazer dinheiro fácil com a destruição da floresta", diz o relatório do Greenpeace chamado "Comendo a Amazônia", de 2006.
Um estudo de dois anos do Greenpeace alegou que a Cargill, ADM e Bunge foram responsáveis por parte do desmatamento da Amazônia ao estimular os produtores a plantarem soja, cujo preço está em alta recorde.
A Amazônia perdeu cerca de 26.000 km quadrados de cobertura florestal só no ano passado, um aumento de 40% em relação ao ano anterior, de acordo com imagens de satélite do Instituto de Pesquisa Espacial do Brasil.
Uma tonelada de dióxido de carbono armazenado, um gás que contribui para o aquecimento global, é lançada na atmosfera a cada vez que uma árvore de 12 metros é cortada.
O Brasil alega estar fazendo maior esforço para regular a expansão agrícola em torno da Amazônia. De fato, com o aumento da preocupação global em relação à mudança de clima, o Brasil está sob forte pressão de seus clientes, especialmente da União Européia, com sua forte consciência ecológica, de melhorar suas práticas agrícolas ou arriscar perder contratos.
A demanda do mercado está crescendo para a chamada "soja responsável", que tem garantia de ter sido plantada em terras legais, não em área de floresta recém-derrubada.
Em uma campanha internacional em 2005, o Greenpeace atacou os produtores de soja brasileiros assim como o McDonald's, que compra galinha alimentada com a soja brasileira para fazer McNuggets.
Em resposta, a Cargill uniu comerciantes com grupos de advocacia e estabeleceu uma moratória sob a qual nenhuma soja seria comprada de áreas ilegalmente desmatadas da Amazônia por dois anos, a partir de 24 de julho de 2006.
Trabalhando com o Nature Conservancy, um dos maiores grupos ambientais americanos, o Projeto Soja Responsável foi lançado. Dois municípios no norte do Amazonas concordaram em adotar o programa, defendido pela Cargill e McDonalds, no qual a soja é comprada apenas de produtores que prometem plantar árvores em terra desmatada.
O Nature Conservancy estabeleceu o programa em torno da firme aderência ao código florestal brasileiro, que ambientalistas dizem ser uma lei excelente, apesar de mal fiscalizada. O código dita que os produtores amazônicos podem plantar apenas 20% de suas terras, preservando o resto como mata virgem.
A idéia parece estar pegando, na medida em que as empresas no Brasil estão de acordo para a demanda do mercado global para produtos sustentáveis, segundo o grupo.
"Estou ficando cada vez mais impressionado com a resposta que estamos tendo do setor privado", disse Klink, do Nature Conservancy. "Os produtores estão compreendendo que, para estar neste mercado global, eles têm que fazer muito mais para cumprir (o código florestal)."
Neste ano, o Nature Conservancy estabeleceu outro projeto em Lucas do Rio Verde, região de cerrado produtora de soja do Mato Grosso, ao sul da Amazônia.
Mato Grosso significa "mata fechada" em português, mas não há muito mais disso em torno de Lucas do Rio Verde.
Trinta anos atrás, a região era de floresta baixa e cerrado virgem. A cidade era pouco mais do que um posto batizado com o nome de um homem solitário chamado Lucas, um dos poucos habitantes da margem do Rio Verde.
Hoje a cidade próspera é uma das que mais cresce no Brasil. Sua população oficial é de 28.000, mas os moradores dizem que é mais para 35.000 e crescendo em 50 pessoas por dia.
Estimulados por uma política de colonização do governo nos anos 70 e 80, a área foi colonizada por agricultores louros de origem alemã do Sul do Brasil.
Em poucos anos, foi transformada na mais produtiva região de soja. Os produtores locais reconhecem que muito da floresta foi derrubado nos primeiros anos. Agora, os produtores estão reflorestando a terra para cumprir o código florestal. No cerrado, a lei exige que 35% de cada propriedade seja preservado com a vegetação natural, além de uma região tampão de 50 metros em torno de rios e nascentes.
Usando imagens de satélite, o projeto identificou rios e nascentes que precisam de proteção. Cerca de 14 km quadrados de terra arada foram identificados e marcados para reflorestamento.
Os produtores parecem entusiasmados, reconhecendo que práticas melhores de produção não são apenas uma estratégia de marketing inteligente, mas também mantêm suas terras mais produtivas.
"É bom para todo mundo", disse Darci Eichelt, 43, que planta 26 km quadrados de soja e milho. Como a maior parte dos produtores, ele está revertendo parte de suas terras para o habitat natural.
Defensores do projeto dizem que está revolucionando a agricultura. "As pessoas entendem que as leis precisam ser respeitadas", disse Luciane Copetti, secretária de agricultura e meio ambiente. "Elas querem consertar os danos, onde foram feitos erros."
Outros municípios próximos estão expressando interesse em copiar o modelo. Eles vêem-no como forma de combater a imagem negativa da soja e dar segurança aos produtores locais.
'Todo mundo aqui tem medo que o resto do mundo não queira comprar nada de nós", disse Paulo Fejeira, agente de desenvolvimento do Estado. "Isso vai ajudar a mostrar que não somos bandidos. Não estamos destruindo a Amazônia."
Tradução: Deborah Weinberg
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